SOBRE A FUNDAÇÃO DA CIDADE DE SÃO PAULO

A cidade de São Paulo foi fundada em função da farinha de mandioca. Em uma carta do padre Anchieta está escrito que: devido à dificuldade de trazer a farinha-de-pau do interior para nossa Capitania de São Vicente (litoral paulista), estamos enviando nossos irmãos para um lugar denominado de Piratininga. Lá ficarão com a responsabilidade de fundarem uma nova missão.

E assim, em 25/01/1554, chegavam ao planalto de Piratininga, em um lugar onde está situado o atual Pátio do Colégio. Lá ergueram um pequeno colégio com a finalidade de catequizar e educar os meninos da tribo. O nome escolhido para esse colégio foi o do santo do dia, que era o apóstolo Paulo.

O sucesso desses missionários, liderado pelo padre Manuel da Nobrega, deveu-se, em grande parte, a João Ramalho, um português que vivia com a tribo e já era pai de uma dezena de filhos. Ramalho já habitava a região nos anos 1532, mas não sabemos se ele era um náufrago, um degredado ou um simples aventureiro. Casado com Bartira (flor de árvore), filha de Tibiriçá (sentinela da terra), chefe indígena da tribo tupiniquim da região, transitava do Pátio do Colégio, ao Largo de São Bento, e a um lugarejo onde fica Santo André, onde já viviam cerca de 30 portugueses. Esse cidadão, Ramalho, foi, também, muito útil ao governo da capitania de São Vicente, Martim Afonso de Sousa, com quem fez grande amizade. Ramalho morreu aos 82 anos de idade, em 1594, e Tibiriçá, em 1562.

O Pátio do Colégio é o alto de uma pequena colina no centro da capital paulista e sob sua encosta estende-se uma vasta planície cortada pelo rio Tamanduateí (rio do tamanduá, no idioma tupi). Piratininga, no idioma tupi, significa peixe a secar, isso por que durante as inundações da planície pelo rio Tamanduateí os índios pescavam e colocavam os peixes para secar. A farinha, o beiju e a própria mandioca cozida eram, em parte, base de sua alimentação. Próximo a este rio havia o Tietê (rio verdadeiro ou rio grande, em tupi) no qual desagua o Tamanduateí. Outro rio que banha a capital paulista e também desagua no Tietê é o rio Pinheiros. Todos eles tornavam férteis as terras da antiga pauliceia, hoje, desvairada.

Quando cheguei em S. Paulo, em março de 1955, ainda conheci as cheias do Tamanduateí e a planície inundada. Tanto ao longo da avenida do Estado, como na parte do Glicério (morei na região). Na realidade, grande parte do parque D. Pedro ficava inundada. Somente anos depois aprofundaram a calha do rio. Conheci, também, a parte do Tietê junto à Ponte das Bandeiras, e lá havia um clube de regata, e seus sócios exercitavam-se em canoas nas límpidas águas daquele rio.

Doloroso observar a falta de água potável para os paulistanos, com represas quase vazias, com apenas 29% de sua capacidade, em pleno verão de 2021-22, e sabedores de três rios urbanos totalmente poluídos.

Recuperação Possível

A Natureza levaria talvez um século para restaurar o vale do Tietê, devolver-lhe a beleza perdida, mas os homens poderiam fazê-lo em 20 anos, gastando alguns bilhões. As medidas começariam por repor a cobertura vegetal, principalmente junto às nascentes; tratar os esgotos que correm para o rio; mudar o modelo do transporte rodoviário; retirar o asfalto das margens do rio, recuperar suas antigas planícies, reflorestá-las inclusive com plantas frutíferas para a fauna animal. E, finalmente, garantir um conteúdo filosófico na educação, voltado para uma compreensão holística do meio ambiente, acessível a todos os brasileiros.

solonsantos@yahoo.com.br – ligeiras notas.

O BICHO
Vi ontem um bicho
Na imundice do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Manuel Bandeira, Rio, 27/12/1947.